A Ucrânia vive uma grave crise
social e política desde novembro de 2013, quando o governo do então presidente
Viktor Yanukovich desistiu de assinar um acordo de livre-comércio e associação
política com a União Europeia (UE), alegando que buscaria relações comerciais
mais próximas com a Rússia, seu principal aliado.
Oposição e parte da população
foram às ruas contra a decisão, em protestos violentos que deixaram mortos. Em
22 de fevereiro de 2014, as manifestações culminaram na destituição do
contestado presidente pelo Parlamento e no agendamento de eleições antecipadas
para 25 de maio.
Nesse intervalo, houve a criação
de um novo governo pró-União Europeia e anti-Rússia, que acirrou as tensões
separatistas na península da Crimeia, de maioria russa, levando a uma escalada
militar com ação de Moscou na região. A Crimeia realizou um referendo que
aprovou sua adesão à Rússia, e o governo de Vladmir Putin procedeu com a
incorporação do território, mesmo com a reprovação do Ocidente.
Em maio, o magnata Petro
Poroshenko foi eleito em primeiro turno, e um mês depois, acabou assinando o
acordo com a UE que foi o pivô de toda a crise. A assinatura ocorreu em meio a
confrontos no leste do país, palco de um movimento separatista pró-Rússia, e a
ameaças e críticas do governo de Moscou.
DISPUTA E INÍCIO DA CRISE
Dias depois de anunciar a
desistência do acordo com a UE, o governo ucraniano admitiu que tomou a decisão
sob pressão de Moscou. A interferência dos russos, que teriam ameaçado cortar o
fornecimento de gás e tomar medidas protecionistas contra produtos ucranianos,
foi criticada pelo bloco europeu.
Milhares de ucranianos favoráveis
à adesão à UE tomaram as ruas de Kiev para exigir que o presidente retomasse as
negociações com o bloco. Houve confrontos. O presidente Yanukovich se
recusou e disse que a decisão foi difícil, mas inevitável, visto que as regras
europeias eram muito duras para a frágil economia ucraniana.
Ele prometeu, porém, criar
"uma sociedade de padrões europeus" e afirmou que políticas nesse
caminho "têm sido e continuarão a ser consistentes". A partir daí, os protestos se
intensificaram e ficaram mais violentos. Os grupos oposicionistas passaram a
exigir a renúncia do presidente e do primeiro-ministro. Também decidiram criar
um quartel-general da resistência nacional e organizar uma greve em todo o
país. O primeiro-ministro Mykola Azarov renunciou em 28 de janeiro, mas isso
não foi o suficiente para encerrar a crise.
Em 21 de janeiro, após aumento da
violência no país, um acordo assinado entre Yanukovich e os líderes da oposição
determinou a realização de eleições presidenciais antecipadas na Ucrânia e a
volta à Constituição de 2004, que reduz os poderes presidenciais. O acordo também previa a formação
de um "governo de unidade", em uma tentativa de solucionar a violenta
crise política.
QUEDA DO GOVERNO
No dia seguinte à assinatura do
acordo, o presidente deixou Kiev para local então desconhecido. Yanukovich
declarou ter sido vítima de um "golpe de Estado". Sua casa,
escritório e outros prédios do governo foram tomados pela oposição. Após a mudança na câmara, os
deputados votaram pela destituição de Yanukovich por abandono de seu cargo e
marcaram eleições antecipadas para 25 de maio.
O presidente recém-eleito do
Parlamento, o opositor Oleksander Turchynov, assumiu o governo temporariamente,
afirmando que o país estava pronto para conversar com a liderança da Rússia
para melhorar as relações bilaterais, mas que a integração europeia era
prioridade.
Yanukovich teve sua prisão
decretada pela morte de civis. Após dias com paradeiro desconhecido, ele
apareceu na Rússia, acusou os mediadores ocidentais de traição, disse não
reconhecer a legitimidade do novo governo interino e prometeu continuar lutando
pela Ucrânia.
As autoridades ucranianas pediram
sua extradição. Ao mesmo tempo, a União Europeia congelou seus ativos e de
outros 17 aliados por desvio de fundos públicos. Alguns dias depois, a imprensa
local informou que ele foi internado em estado grave, possivelmente por um
infarto. Em 11 de março, entretanto, ele apareceu publicamente, reafirmou que
ainda é o presidente legítimo e líder oficial do país, e afirmou ter certeza
que as Forças Armadas locais irão se recusar a obedecer “ordens criminosas”. Em 27 de fevereiro, o Parlamento
aprovou um governo de coalizão que vai governar até as eleições de maio, com o
pró-europeu Arseny Yatseniuk como premiê interino.
INTERESSE RUSSO
Para analistas, a decisão do
governo de suspender a negociações pela entrada na UE se deveu diretamente à
forte pressão de Moscou. A Rússia adotou medidas como inspeções demoradas nas
fronteiras com a Ucrânia e o banimento de doces produzidos no país vizinho,
além de ter ameaçado com várias outras medidas de impacto econômico.
A Ucrânia está em uma longa
disputa com Moscou sobre o custo do gás russo. Em meio à crise, a companhia
russa Gazprom anunciou um aumento de 40% no preço do gás fornecido à Ucrânia e
ameaçou cortar o abastecimento. Além disso, no leste do país –
onde ainda se fala russo – muitas empresas dependem das vendas para a Rússia.
Yanukovich ainda tem uma grande base de apoio nesta região.
Após a deposição do presidente, a
Rússia disse ter "graves dúvidas" sobre a legitimidade do novo
governo ucraniano, e afirmou que o acordo de paz apoiado pelo Ocidente no país
foi usado como fachada para um golpe. Putin emitiu uma lei na qual
aprovava a intervenção russa no leste ucraniano, para proteger a população de
idioma russo. A medida levantou muita polêmica, e acabou sendo revogada alguns
meses depois, com o início de negociações de paz com a Ucrânia.
CRIMÉIA
A destituição de Yanukovich
aumentou a tensão na Crimeia, uma região autônoma, onde as manifestações
pró-Rússia se intensificaram, com a invasão de prédios do governo e dois
aeroportos. Com o aumento das tensões
separatistas, o Parlamento russo aprovou, a pedido do presidente Vladimir
Putin, o envio de tropas à Crimeia para “normalizar” a situação. A região aprovou um referendo
para debater sua autonomia e elegeu um premiê pró-Rússia, Sergei Aksyonov, não
reconhecido pelo governo central ucraniano.
Dois dias depois, em 6 de março,
o Parlamento da Crimeia aprovou sua adesão à Rússia e marcou para 16 de março
um referendo para definir o status da região. Na votação, a população da
Crimeia aprovou a adesão à Rússia por imensa maioria. O resultado não foi
reconhecido pelo Ocidente. Mesmo assim, Putin e o
auto-proclamado governo da Crimeia assinaram um tratado de adesão, e a
incorporação foi ratificada. Em seguida, tropas que seriam russas passaram a
cercar e invadir postos militares na Ucrânia. A Ucrânia convocou todas suas
reservas militares para reagir a um possível ataque russo e afirmou que se
trata de uma "declaração de guerra".
LESTE DA UCRÂNIA
Após a adesão da Crimeia ao
governo de Moscou, regiões do leste da Ucrânia, de maioria russa, começaram a
sofrer com tensões separatistas. Militantes pró-Rússia tomaram prédios públicos
na cidade de Donetsk e a proclamaram como "república soberana",
marcando um referendo sobre a soberania nacional para 11 de maio.
A medida não foi reconhecida por
Kiev nem pelo Ocidente. O referendo chegou a ser realizado e a independência
foi aprovada por 89% dos votos - entretanto, nada de oficial ocorreu
posteriormente, e a Rússia também não agiu na região. Outras cidades também tiveram
atuação de milícias russas, como Lugansk e Kharkiv, onde militantes invadiram
prédios governamentais – no que Kiev afirma ser um plano liderado pela Rússia
para desmembrar o país.
Com a nova tensão na região, a
Rússia pediu que a Ucrânia desistisse de todo tipo de preparativos militares
para deter os protestos pró-russos nas regiões do leste ucraniano, já que os
mesmos poderiam suscitar uma guerra civil. O governo de Kiev, entretanto,
iniciou uma "operação antiterrorista" na região, para combater os
separatistas, com centenas de mortes dos dois lados. Os confrontos continuaram
ao longo dos meses de maio e junho, com um certo enfraquecimento dos rebeldes. A Rússia chegou a mobilizar
tropas na fronteira, o que foi condenado por Kiev e pelo ocidente. Parte das
tropas foi retirada posteriormente, mas a tensão permaneceu na região.
POSIÇÃO INTERNACIONAL
As ações do governo russo levaram
o presidente dos EUA, Barack Obama, a pedir a Putin o recuo das tropas na
Crimeia. Para Obama, Putin violou a lei internacional com sua intervenção. Os EUA também anunciaram sanções
contra indivíduos envolvidos no processo e suspenderam as transações comerciais
com o país, além de um acordo de cooperação militar. A Rússia respondeu
afirmando que o estabelecimento de sanções também afetaria os EUA, e criou
impedimentos para cidadãos americanos.
A União Europeia também impôs
sanções contra russos. O Ocidente pressionou a Rússia
por uma saída diplomática. A tensão levou a uma ruptura entre as grandes
potências, com o G7 condenando a ação e cancelando uma reunião com a Rússia. Já a Otan advertiu a Rússia
contra as "graves consequências" de uma intervenção na Ucrânia, que
seria, segundo ele, um grave "erro histórico".
O aumento da violência mudou o
tom da diplomacia, e até os Estados europeus mais cautelosos estão falando cada
vez mais da probabilidade de uma guerra no país de cerca de 45 milhões de
pessoas e com território do tamanho da França.
NOVO GOVERNO E ACORDO COM A UE
Em 25 de maio, o magnata Petro
Poroshenko foi eleito em primeiro turno na Ucrânia, em uma eleição que foi
boicotada por insurgentes das regiões de Donetsk e Lugansk. Duas semanas depois, ele teve seu
primeiro encontro com Putin, no qual os dois concordaram que era necessário
parar o banho de sangue no sudeste da Ucrânia - um "frágil passo"
rumo a uma solução política para a crise.
Algumas semanas depois, em junho,
Poroshenko anunciou um cessar-fogo de uma semana no leste ucraniano e um plano
de paz, que previa um diálogo com os rebeldes pró-russos sem envolvimento em
atos "de assassinato ou tortura"; a criação de uma zona de segurança
de 10 km ao longo da fronteira entre a Ucrânia e a Rússia; e um corredor para
os mercenários russos para que deixem o país depois de terem entregue suas
armas.
A Rússia e os rebeldes aceitaram
o cessar-fogo e o início de diálogos, mas a Ucrânia denunciou que houve
violações do acordo.
FONTE: G1
Nenhum comentário:
Postar um comentário