quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Porta dos Fundos e a barbárie

Conhecidas são as conseqüências e os graves efeitos de dano social quando o humor é utilizado com arma de perversão sexual e afronta à moral religiosa. 


      Nas vésperas do Natal, na noite santa de 24 de dezembro, solicitaram-me ver e denunciar o filme "Especial de Natal", do grupo "Porta dos Fundos". Impactado, percebi de imediato a gravidade da situação. Blasfemo e sacrílego, o ateu declarado Fábio Porchat, roteirista do filme, infringiu o artigo 208 do Código Penal: 

 "Dos Crimes contra o sentimento religioso: Ultraje a culto e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo. Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa..."

 Escárnio do sentimento religioso, vilipêndio, zombaria. A intencionalidade do escárnio e, portanto, da provocação deliberada aos cristãos, se comprova na data escolhida para a exibição do filme, na festa celebrada em todo o mundo, do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo. 

     O ateísmo militante do "Porta dos Fundos", desponta como uma força a mais na somatória de hostilidades ao cristianismo, que desde a Renascença tais agressões vem se articulando, e obtiveram o poder político depois da Revolução Francesa, e hoje agem como força globalista a intensificar cada vez mais seu ódio ao cristianismo, utilizando-se de todos os meios para isso, e mirando cada vez mais na doutrina católica. 

     Hoje, com alto poder tecnológico e financeiro, o ateísmo militante (na soma dessas forças) se sente preparado para agir com quase inteiro destemor, para corroer ainda mais a tessitura civilizacional, e estender a barbárie por toda a parte, inclusive o surrealismo e o anarquismo sexual (como explicitado na esquete "Sobre a Mesa", do mesmo grupo). Neste contexto, "só o Deus moral é refutado", como queria Nietzsche, "e o reino dos céus encontra-se imediatamente ao nosso alcance" (Camus), dando mais força ao mais forte, que poderá então saciar todas as volúpias, violentando o mais fraco, de todas as formas. É o que pede a personagem mulher de "Sobre a Mesa", quando responde ao marido que o que deseja mesmo é ser violentada sexualmente, por tudo e por todos, e de todas as maneiras, até a extenuação total. E para isso acontecer, é preciso extinguir todo limite moral, para que os fortes (os mais fortes) possam gozar de todas as delícias epidérmicas, esmagando os fracos, na pior lógica do darwinismo social. 

    É evidente a violência travestida de sátira nas esquetes do "Porta dos Fundos". O riso não é condenável, em si, mas quando utilizado como arma de perversão sexual e afronta religiosa, torna-se abominável. Ainda bem antes da hegemonia da televisão nos meios de comunicação, Frederick Wertham advertiu sobre os graves efeitos da violência contida nas histórias em quadrinhos, especialmente no comportamento de crianças e adolescentes, como lembra Roger Shattuck, em "Conhecimento Proibido" (Companhia das Letras, 1998). E que também conta que para Bruno Bettelheim, as estórias de contos de fadas, "ensinam as crianças não a imitar a crueldade e a destruição, mas a vencê-las". O fato é que fez parte do projeto revolucionário banir toda e qualquer restrição à criatividade literária, para justamente fomentar a perversão e seus inevitáveis efeitos de crueldade e destruição de valores humanos (daqueles valores que efetivamente humanizam), consolidados pelo cristianismo, e por causa de tais valores foi possível o esplendor da civilização ocidental. 

    Mas a libido scendi (libido pelo conhecimento) não contem o afã da barbárie. Goethe que o diga, com "Fausto"! Mesmo assim, o furor da hybris, tão temido pelos gregos antigos, avançou com os libertinos do séc. XVII e XVIII, até encontrar em Sade sua expressão mais tenebrosa. E agindo como demolidores constantes do cristianismo, tiveram força suficiente no final do século XX para reabilitarem Sade, incluindo-o na plêiade francesa, tido hoje como um ícone dos que se sentem fortes para desferir mais golpes contra a moral cristã. Querem vingar Sade pelos anos que passou preso na Bastilha. 

 Entre as acusações contra Sade, relata Shattuck, 

 "estavam a sodomia homossexual e heterossexual (...) vários espancamentos com chicote e possíveis ferimentos à faca em prostitutas, a masturbação sobre um crucifixo, corrupção de adolescentes, ameaças de morte e outros excessos". "De temperamento sexual vulcânico, Sade tinha dificuldade em atingir o orgasmo. Duas práticas o auxiliavam: a dor, causada ou sofrida, e a sodomia passiva, simulada na prisão com pênis artificiais que a mulher encomendava especialmente para ele". 

     Mas hoje Sade está na plêiade, em edições de luxo, enaltecidos por Camille Paglia, entre outros, inspirando o humor cáustico e sórdido a ser mais intenso na corrosão da moral cristã, pois desejam é reduzir a pó o edifício cristão. Para aí sim, fazer prevalecer a República de Saló, em escala global. 

     O que o "Porta dos Fundos" está disposto a fazer é escancarar a porta para a República de Saló, onde os mais fortes sempre terão todas as vantagens, à custa dos padecimentos de quem puderem se aproveitar para seus fins de poder, sem nenhuma piedade nem humanidade. Quando a personagem mulher da esquete "Sobre a Mesa" diz ao marido querer mesmo é ser violentada sexualmente por muitos e de todas as formas, faz empalidecer Sade, em seu afã de perversidade. O pior é que na mentalidade dos defensores de Sade, como Jean Paulhan, a perversão sexual não é crime, mas direito a felicidade. Os excessos do sadismo, não são vistos como crime, mas como expressão extrema do egoísmo utilitarista, apenas isso. Mas quem tiver força e puder fazê-lo, qual o problema? Que cada um saiba como se defender disso. "Seja, pois um forte". Nessa lógica, o mais terrível efeito dos excessos decorrentes da liberdade total, é que o forte só poderá exercer sua força de volúpia total, impondo a dor aos demais, tendo prazer inclusive na dor de seus subjugados. E é isso justamente que a moral cristã visa conter e deter, e tendo feito isso, foi capaz de civilizar. Com o "Porta dos Fundos", a porta se escancara ainda mais para a extensão da barbárie, com os seus já bem conhecidos danos sociais. 

Hermes Rodrigues Nery é autor do romance "O Dilema de Páris" (Edicon, 1996); "Presença de Rachel - conversas informais com a escritora Rachel de Queiros, FUNPEC, 2002) e "A Igreja é Viva e Jovem" (Ed. Linotipo Digital,, 2013).

Nenhum comentário:

Postar um comentário